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Nestes dias da quadra natalícia andei, juntamente com um grupo de adolescentes da catequese de Leça da Palmeira e suas famílias, a percorrer algumas das artérias leceiras e a cantar canções de Natal/janeiras. O objetivo era o de sempre. Angariar fundos para algumas das atividades que os adolescentes vão efetuar nos próximos meses.
Um dos aspetos que mais me chamou a atenção foi a quantidade de famílias que se aproximavam das janelas para ouvir-nos. Os mais novos, então, deliravam. Mas, em todos, novos ou menos novos, notava-se um certo ar de espanto e admiração. Parece que para muitas dessas famílias era uma grande novidade, quase como se nunca tivessem visto tal coisa.
Isso levou-me a refletir acerca das tradições leceiras e, cantar as janeiras, era uma das principais.
Não esqueçamos que Leça da Palmeira se desenvolveu baseada em dois núcleos, um ligado ao mar e outro à lavoura. Quer um quer outro, no entanto, baseado no trabalho diário e duro que aqueles e mulheres desenvolviam. Os momentos de lazer eram poucos, quase unicamente nos dias de feriado, nas romarias e nas datas festivas mais marcantes.
Segundo o Engenheiro Rocha dos Santos, «no inicio do mês de janeiro era hábito grupos percorrerem as ruas acompanhados por música de um ou outro instrumento musical, indo de porta em porta cantar as janeiras. Se o dono da casa correspondia abrindo-lhes a porta, cantavam-lhe: “Viva o dono desta casa / Raminho de salsa crua / Quando se põe á janela / Ilumina toda a rua”. “Viva a dona desta casa / Quando põe o seu mantéu / Quando vaia para a igreja / Parece um anjo do céu. Viva tudo, Viva tudo / Viva tudo nesta hora / Viva também o menino / Para não ficar de fora”; caso isso não acontecesse, gritavam: “nesta casa cheira a unto aqui mora algum defunto. Esta casa cheira a breu aqui, morreu algum judeu”. E… toca a fugir!» (in “A Voz de Leça” Ano LV – Número 4 – junho de 2008)
Confesso que não me lembrava destes dizeres. Recordo-me, isso sim, de andar com os meus colegas pelas ruas a cantar as janeiras, mas canções mais conhecidas, aquelas que vêm nos livros dedicados aos mais novos. Lembro-me que eram momentos de convívio espetaculares, de socialização, do reforço de laços de amizade.
As tradições são parte da nossa memória coletiva, mas também ajudam a definir quem somos no presente. Daí que são de louvar todas as ações levadas a cabo para recordar as tradições leceiras.
As escolas desempenham neste âmbito um papel fundamental, principalmente as do 1º ciclo. Em Leça da Palmeira não é de estranhar que no Plano Anual de Atividades do Agrupamento de Escolas Eng. Fernando Pinto de Oliveira constem atividades relacionadas com as tradições e, em concreto, o cantar as janeiras.
De destacar e louvar é, também, o Rancho Típico da Amorosa. Praticamente todos os anos leva a cena um espetáculo onde mostra os momentos de lazer do lavrador leceiro ao longo dos 365 dias do ano, numa altura em que o calendário era definido pelos círculos agrários e não tanto pelos meses. Nesse espetáculo são apresentadas diversas tradições, entre elas os cantares das janeiras, de forma a “recordar” os mais velhos e a “ensinar” os mais novos.
Até à próxima semana.
Saudações leceiras
Joaquim Monteiro
(Foto do Rancho Típico da Amorosa)
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