O terror em Paris nas palavras de um casal de Matosinhos

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O P24 encontrou dois portugueses que estavam presentes no jogo entre a Alemanha e a França quando decorreram os atentados em Paris. O casal contou-nos a noite de pânico e terror aquando dos ataques na capital francesa.

Na noite de sexta-feira 13, um grupo de 8 indivíduos armados com espingardas automáticas, granadas e cintos carregados de explosivos lançaram o caos na capital francesa. Um atentado terrorista que vitimou, segundo autoridades francesas, 129 pessoas e feriu mais de 3 centenas. Uma ação terrorista reivindicada pelo Estado Islâmico.

Primeiro no Stade de France e depois na rua, a fugir dos ataques e do perigo, estavam dois jovens portugueses.

Daniela Fogageira e Bruno Arcos, ela de Leça da Palmeira e ele de Matosinhos, são namorados e estavam de férias em Paris desde o dia 10 de Novembro. No fatídico dia 13, rumaram ao Estádio de França.

Daniela começou por contar ao P24 que era um dia como os outros. “Quando partimos rumo ao Estádio de França, sentíamos que já conhecíamos Paris e estávamos maravilhados, queríamos apenas desfrutar um pouco mais da cidade antes do regresso a casa.”

Já no estádio, o casal ouviu as duas explosões no exterior, uma a seguir à outra. “Honestamente, nunca nos passou pela cabeça, em momento algum, que pudesse tratar-se de um atentado terrorista. Pareciam sons relativamente típicos num jogo de futebol, quase como fogo-de-artifício ou petardos”, conta.

Bruno confirma a visão da namorada, embora tenha estranhado os estrondos. “É curioso, mas ao ouvir os sons das explosões comentei ‘petardos num jogo amigável? Estranho!’, mas não demos grande importância ao assunto.”

O casal revelou que as explosões foram ignoradas e o jogo prosseguiu sem grande agitação. No entanto, a certa altura, repararam num grande número de chamadas não atendidas em ambos os telemóveis, todas de familiares. Daniela atendeu de imediato a chamada seguinte. Era uma tia, muito preocupada. “Senti o alívio na voz dela quando me ouviu. Disse-me que Paris e o estádio estavam a ser atacados e suplicou-me que nos mantivéssemos no interior. Já se sabia da morte de pelo menos 16 pessoas”, revela. Daniela estranhou a preocupação excessiva da tia, mas achou por bem avisar os restantes familiares que tudo estava bem. O jogo continuou e tudo prosseguiu. O casal forneceu ao P24 um vídeo que demonstra bem o ambiente de euforia e despreocupação no final do jogo.

Foi à saída do estádio que tudo correu mal. Dirigiram-se para a escadaria que conduzia ao metro, mas, ao aproximarem-se da mesma, “uma multidão de pessoas com os rostos em pânico recuava, correndo, fugindo e empurrando quem se colocasse à frente”. “Deu-se uma reação em cadeia e o pânico instalou-se. Todas as pessoas corriam para longe do metro, regressando ao interior do Estádio, separando casais e famílias no meio da confusão”, diz.

Daniela tem bem vivas na memória imagens do que se seguiu. “Lembro-me do choro das crianças. Da confusão. Dos gritos. Da sensação de terror que se instala quando fugimos sem saber do quê. O Bruno praticamente atirou-me para dentro do Estádio no meio da massa de pessoas que se esmagavam para atravessar os portões de regresso. ”

Por breves momentos o casal separou-se. “Estiquei a mão para alcançá-lo e fiquei perto dos portões até estarmos juntos outra vez. Terão sido segundos, mas pareceu uma eternidade”, conta.

De volta ao interior do estádio, o casal contou ao P24 que o que se via nas ruas eram  ”pessoas deambulavam perdidas, a maioria a falar ao telemóvel, muitas em lágrimas”. Foi aí que finalmente se aperceberam da gravidade da situação. “O medo instalou-se por completo, a insegurança. Abordámos algumas pessoas, queríamos mais informações, mas poucos eram aqueles que sabiam falar inglês”, explica.

Dirigiram-se às bancadas mas em seguida foram para o relvado. “Os polícias e seguranças do Estádio faziam um círculo à nossa volta. Nesse momento, tornou-se real: Paris estava sob ataque e nós estávamos ali, sem saber o que se passava e o que iria acontecer”.

Daniela confessou o terror do momento. “Senti-me aterrorizada. As minhas mãos tremiam ligeiramente. Algumas pessoas estavam absolutamente tranquilas, riam e tiravam fotografias. Mas a maioria das pessoas parecia apática. Cruzei o olhar com pelo menos duas mulheres com os olhos cheios de lágrimas.”

Com o pânico e o medo instalado, o casal procurou informações junto das forças policiais, mas “nenhum dos polícias respondeu quando questionámos se falavam inglês”. “Um jovem ouviu a nossa aflição e aproximou-se. Falava bem inglês e explicou-nos o que se passava: tiroteios e atentados bomba. Também ele estava desolado”, conta. Eram aproximadamente 23h45 quando uma das portas se abriu e o casal decidiu sair. As ruas, contam, estavam desertas em redor do estádio. Com a exceção, claro, daqueles que, como Daniela e Bruno, fugiam pelas suas vidas.

Em seguida, declarado o estado de emergência, as ruas foram ocupadas. “Equipados e armados de forma intimidante. Quando tentámos pedir direções a um dos militares gritou-nos “STOP!” e elevou ligeiramente a arma. Ficámos aterrorizados. Ninguém nos explicava se era seguro avançar pelas ruas ou não”, recordam.

Finalmente chegaram ao metro, numa viagem que nunca vão esquecer. Foi “curta mas tenebrosa”. “O metro estava absolutamente cheio mas o silêncio reinava”.

Mas a viagem foi talvez um dos momentos mais calmos da noite para o jovem casal, pois saídos do metro encontraram militares que gritaram palavras que não entendiam para a multidão. Amedrontada e em choque pelo que tinham presenciado, todos desataram a fugir e a saltar os torniquetes. O pânico fazia-se sentir uma vez mais.

Já lá fora, fizeram os possíveis para se afastar da zona. Por fim, chegaram ao hotel. Abraçaram-se, aliviados com a sensação de terem chegado a um porto seguro. No meio de toda a confusão, os seus telefones não paravam de tocar.

Instalados na segurança do hotel, tentaram contactar o aeroporto e a embaixada portuguesa, mas nenhuma das chamadas obteve qualquer sucesso.

Ficaram acordados até tarde, a ver as notícias, acabando por adormecer depois de tudo o que tinham passado naquela noite. Algumas horas depois, encaminharam-se para o aeroporto de Beauvais. “Tudo parecia regressar, ainda que muito lentamente, à realidade do quotidiano. Os militares armados estavam por toda a parte”, contam.

Por fim, o avião descola, e só aí Bruno deu tudo por terminado. “Só quando o avião levantou voo rumo ao Porto é que tivemos a certeza de que tudo iria realmente ficar bem. A sensação de alívio é indescritível”.

Viveram o terror bem de perto, mas, ao contrário do que se vê por toda a parte nas redes sociais e em discursos, têm uma visão bem clara de quem é e quem não é o inimigo. ”É importante explicar às pessoas que o medo sentido em Paris na noite de 13 de Novembro é o mesmo sentido por tantas outras pessoas que fogem da guerra em busca de segurança. A mesma segurança que nós os dois tivemos  ao regressar ao Porto. Paris está de luto e nós estamos de luto por Paris. E pelo mundo”.

In Porto24


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